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26 de janeiro de 2015

A ambiguidade da Globo no julgamento dos corruptos, por J. Carlos de Assis

A ambiguidade da Globo em relação ao julgamento dos corruptos
J. Carlos de Assis
O esforço da Tevê Globo em submeter o Brasil à soberania e às instituições americanas chegou sexta-feira ao Judiciário: reportagem no Jornal Nacional mostrou como os honestíssimos cidadãos norte-americanos processam e condenam autoridades corruptas. A diferença essencial em relação ao nosso sistema é que lá os políticos são processados pela Justiça Comum, enquanto aqui eles se submetem a foro privilegiado, isto é, aos tribunais superiores.
Não entendi bem qual é a da Tevê Globo. Se ela quer um sistema que facilita a condenação, como tem sido sua inclinação ideológica, deveria estar muito satisfeita com o nosso sistema de foro privilegiado. Basta observar que há muito político por aí, processado por corrupção, que renunciou a mandato parlamentar para cair na Justiça comum. A propósito: se fosse na Justiça comum, o julgamento do chamado “mensalão” ainda estaria em curso.
É possível que o entusiasmo da Globo com a Justiça comum deriva do comportamento atípico do juiz Moro no caso da operação Lava Jato. Esse juiz, ao arrepio da lei, inventou a instituição no Brasil do juiz de instrução, especificidade do sistema italiano adotada com grande sucesso contra a máfia. Assim, juiz, polícia e promotoria formam o mesmo juízo em relação ao processo. Fora fica apenas o advogado da defesa.
Se eu fosse a Globo, que já teve alguns problemas com o imposto de renda, trataria de apoiar o sistema tradicional brasileiro, onde a polícia investiga, a promotoria avalia a investigação e, se for o caso, faz a acusação, e o juiz acolhe ou não a denúncia, em passos independentes entre si. Em seguida, se acolhida a denúncia, a ação vai a julgamento, no qual o juiz ocupa uma posição idealmente imparcial entre a acusação e a defesa, emitindo, finalmente, uma sentença supostamente justa.
Sabemos que, no caso do mensalão, a coisa não foi bem assim. Levada diretamente ao Supremo, a ação seguiu o rito de um juízo de instrução: investigação, promotoria e o juiz-relator estiveram sempre do mesmo lado. O curso rápido da ação se deveu a seus aspectos políticos: Joaquim Barbosa quis ter seu momento de Torquemada, insuflado que foi pela grande mídia num comportamento típico de manada, sem qualquer juízo crítico no acompanhamento da história.
O sistema norte-americano tem uma vantagem não mencionada pela tevê: lá, a lei é feita de forma a preservar a empresa dos malfeitos de seus donos e dirigentes. Ao contrário do que querem os promotores da Lava Jato, condena-se o responsável pelo crime, enquanto a empresa leva, no máximo, uma pesada multa. Lá não cabe uma lei, como a 12 846 de 2013, que estabelece “a responsabilização objetiva, administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira”. Empresa não comete crime. Quem comete crime são seus donos. Do contrário, é a sociedade que é condenada na forma de perda de empregos, de tecnologia e de renda.


J. Carlos de Assis - Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, professor de Economia Internacional da UEPB.

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